terça-feira, 19 de novembro de 2013

Crê Ser

Ela era a sua menininha: bonitinha e teimosa. Sempre cheia de razão, chorando sem motivo e brincando com o perigo. Coisa de criança.
Chegou o tempo de crescer, mas ela se negou. Não conseguia ser mais que uma menina chorona. Ela só queria ser a sua menininha... e você esperava bem mais.

Aquela criança trancada num corpo estranho foi se machucando. Cobravam dela a postura da mulher que ela aparentava ser. Ela sofria. Queriam que ela se vestisse, falasse, saísse, vivesse de forma condizente com o que era... E ela ainda não era o que todos viam.

Mas chega uma hora em que as coisas precisam mudar. Ou mudam sem que haja muita escolha. Ele se foi e levou tudo. Ela ficou. Se viu sem berço. Quem vai colocá-la no colo? Cantar para que se acalme? Fazer gracinha para ela rir? Protegê-la e velar seu sono? Quem vai buscá-la quando estiver em perigo? Levá-la para passear? Contar histórias e brincar? Brigar e ensiná-la a ser melhor?

Ela agora está sozinha e não tem nenhum braço para lhe abraçar, nenhuma voz para lhe ninar, nenhum olho pra lhe vigiar.

Terá que mudar.

Ela tenta. Coloca máscara, veste capa, ensaia palavras. Nem sempre dá certo.

Ela tenta. Chora escondida, foge dos amigos, anda sem rumo. Nem sempre dá certo.

Ela tenta. Faz planos, conhece pessoas, busca conhecimento. Nem sempre dá certo.

Ela tenta. Ri sem motivo, compra coisas que não usa, joga fora suas lembranças. Nem sempre dá certo.

Ela tenta. Arruma seu quarto, ouve música, escreve. Nem sempre dá certo.

Ela tenta.

Um dia dá certo. Nos outros dias não.

Mas ela tenta. Uma hora tudo se resolve. (Ou não.)

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